segunda-feira, setembro 11, 2006

TELEJORNAIS
PARTIDOS POLÍTICOS
“RENTRÉES”


No blogue "O Canhoto", do passado dia 6, Paulo Pedroso demonstra estranheza sobre a pouca atenção que os noticiários dos nossos canais televisivos dedicam aos partidos políticos.
Darei um exemplo de como funcionam noutros países.

Os noticiários italianos, por via de regra, não duram mais que trinta minutos.
Um bom quarto de hora é dedicado à passerelle dos políticos: porta-vozes, secretários de pequenos partidos, cabecilhas das várias correntes de partido, enfim, o desfile é heterogéneo.
O director de cada telejornal, de cronómetro na mão, deve estar atento aos minutos concedidos a cada interveniente.
E assim, a propósito de qualquer facto político, acontecimento que constitua notícia, estes senhores, em fila, devem dizer ao país o que pensam, qual a sua opinião - como se todos estivessem ansiosos de conhecer essas opiniões!...

O director do TG1 (refiro-me à RAI), Clemente Mimun, durante o governo Berlusconi, inventou as intervenções a que chamaram"sanduíche” e que funcionam deste modo: primeiro, exprime-se a maioria; em seguida, a oposição ("ensanduichada!"); por último, e de novo, a coligação de governo. As razões destes, claro está, deveriam ficar bem impressas nos ouvidos dos telespectadores. Um telejornal de uma isenção exemplar!...
Presentemente, com o centro-esquerda a governar e os noticiários RAI sempre nas mãos de fieis «berluscones»… a sanduíche tem sempre o mesmo recheio!

Que apresentem declarações de um primeiro-ministro, de qualquer ministro sobre assuntos atinentes ao seu ministério, de qualquer político responsável e de peso - ou mesmo declarações de quaisquer outros altos servidores do Estado - é óbvio que o noticiário se torna mais vivo e de grande interesse.
Não o é, todavia, quando desfila a passerelle de elementos políticos, tantas vezes medíocres, com banalidades estúpidas, flechadas aos adversários ou exibicionismos oratórios. E de todo esta palha inútil, nada é poupado ao telespectador. Mas o ritual deve cumprir-se. Só me admira que pessoas de bom senso se prestem a tão deprimente espectáculo. Tanto mais que são intervenções anteriormente registadas e sem qualquer espécie de contraditório.

Actualmente, discute-se a remodelação da RAI: dirigentes, directores de telejornais, directores de serviços vários, etc. Romano Prodi, o Primeiro-Ministro, confessou que o problema RAI é pior que a missão no Líbano. Isto já diz tudo!

A RAI, em todas as legislaturas, tem sido politizada; melhor, as garras dos partidos – quer de direita, centro ou esquerda - sempre a condicionaram.
A situação, porém, atingiu o ápice da manipulação com o Governo Berlusconi. Não somente dominava os seus três canais (Itália1, Rete4, Canal5), como usou a RAI com a desenvoltura de verdadeiro patrão. Nos grandes serviços em que a sua real figura era protagonista, por exemplo, preferiu e serviu-se abundantemente de operadores privados, menosprezando os serviços técnicos da RAI.
Se algum colaborador da RAI o atacava, não tinha escrúpulos, com o zeloso auxílio dos dirigentes, de o excluir dos programas televisivos – e isto aconteceu.

Como formação política, considero-o um perfeito demagogo, um populista despudorado. Como homem de espectáculo, um mestre: soube (e sabe) usar as televisões magistralmente!

Voltemos ao princípio deste post.
Recordo a polémica, proveniente do jornal Público, sobre a intromissão do governo Sócrates nos noticiários relativos aos incêndios deste ano.
É uma polémica justa, mas bastante «à água de rosas». Talvez o hábito de seguir a RAI me tenha imunizado contra surpresas deste género.

Paulo Pedroso gostaria de ver, nos telejornais portugueses, os nossos políticos prestar-se a um papel como o que acima descrevi?
Não queira dar mais motivos para anátemas ou desprestígio para os partidos!

Mas se acha que deveriam constituir uma maior percentagem de “tempo noticioso”, eu daria um conselho: juntamente com um cargo ou uma actividade política, liguem-se a um clube prestigioso de futebol, patrocinem qualquer campeão do mesmo ramo. Neste caso, então, a presença de políticos, nos nossos noticiários, seria transbordante!

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A RENTRÉE

Todos os anos, por esta altura, começa o uso desenfreado do francesismo rentrée.
Em todos os jornais, é um minuete contínuo: a rentrée política, a rentrée judiciária, a rentrée de todas e quaisquer actividades pós-férias. Todavia, aplica-se com mais insistência à reabertura da actividade política.

Para esta palavra, o nosso dicionário apresenta vários e validíssimos significados: reabertura, regresso, reentrada, etc. Quem estudou francês, deve recordar a “rentrée des classes” – a reabertura das aulas.
Que se adoptem palavras que não têm tradução adequada no nosso vocabulário, é sempre um óptimo recurso para o enriquecimento da língua. Falamos línguas vivas, não mortas.
Que se use, a torto e a direito, estrangeirismos para os quais há vocábulos equivalentes, isso não passa de um abastardamento do português. Tão estúpido quão pedante e inútil.
Alda M. Maia