segunda-feira, outubro 01, 2012

DEPRIMENTE!

Sobre a crise que persiste e cujos efeitos nos angustia, lêem-se opiniões eruditas, sérias e profundas análises, múltiplas explicações, debates capazes de captar interesse e aclarar razões até então nebulosas. Todavia, recapitulando todas essas leituras, que certezas se obtêm?
Para iniciar, uma certeza que já na semana passada ficou bem patente na entrevista a Zygmunt Bauman e que traduzi neste blogue: a ditadura da casta económico-financeira e o aviltamento da política.

Como consequência deste aviltamento, surgiu:
A «internacional dos capitalistas», uma elite global que concentra em si um poder imenso. Efectivamente, é bem noto que, em Wall Street, os dirigentes dos grandes bancos e das sociedades financeiras se reúnem periodicamente a fim de estabelecer as taxas de juros e, através das decisões de investimento ou de desinvestimento, podem subtrair a confiança aos governos que actuam políticas incómodas. Estão em posição de condicionar o destino de inteiras populações”. [...] 
"Às mil explicações da crise, nós acrescentamos uma outra: a liberalização do movimento dos capitais que, no início dos anos 80, pôs fim ao grande compromisso de Bretton Woods, fundado, precisamente, sobre a proibição de circulação de capitais à qual servia de contrapesa a liberdade de circulação das mercadorias”Giorgio Ruffolo e Stefano Sylos Labini.

As opiniões, expressas de uma maneira clara ou menos clara, são quase unânimes. Não são as dívidas soberanas ou privadas as causadoras da grande onda de desemprego e falências que assolam os países endividados, mas a política que não sabe ou não quer opor-se a este estado de coisas, criando regras bem explícitas e básicas a nível mundial, contra as corridas desenfreadas dos capitais. De caminho, estabelecer normas justas para a selvagem deslocalização das empresas.
Estas correm e saltitam de um lado para o outro, atrás da mão-de-obra barata, assim como de convenientes ajudas financeiras e fiscais, cinicamente indiferentes a centenas ou milhares de pessoas que ficarão sem emprego. Lucros e dividendos, dividendos e lucros: o estribilho da ganância incontrolada, no mundo que hoje conhecemos.

Voltando ao aviltamento da política, pois não sei que outro nome dar a uma falta de visão e coragem para enfrentar este capitalismo vazio de criatividade e humanidade, inevitavelmente o pensamento corre para a confiança que temos na classe política. Na Itália está nos 4%; e aqui em Portugal?

As minhas cogitações, relativamente a este argumento, giram sempre à volta da idoneidade e, sobretudo, da isenção de quem está no Governo ou de quem, no Parlamento, deve decidir sobre a coisa pública. E a minha pergunta constante é esta: é admissível que pessoas ligadas aos grandes e pequenos interesses – clara ou ocultamente - possam ocupar-se de políticas vitais para o bem comum?
É também admissível que, abandonando a actividade política, imediatamente assumam altos cargos em grandes empresas, passem a consultores das mesmas ou algo parecido? Como é possível crer na isenção desta gente?!

Partindo desta premissa, não é difícil concluir, com amargura, que a política jamais vencerá a crise se não se desligar desta quinta coluna do  capitalismo financeiro e de outros poderes, quando indiferentes ou até contrários à prática de uma política sã e objectiva.
Como política sã e objectiva eu entendo a que vigia equitativamente o bem-estar social e, paralelamente, encoraja o bom andamento de um capitalismo que dá trabalho e respeita a dignidade do mesmo; produz e inova para atingir uma competitividade indispensável; que é um convicto partidário da concertação social e não olha com desdém para as classes sociais menos favorecidas. A este propósito, considere-se, como exemplo repulsivo, a mentalidade política do candidato republicano às próximas eleições presidenciais nos EUA.

É deprimente, hoje, verificar as tergiversações da política da União Europeia que dá um passo à frente e outro atrás. Onde há países-membros que tudo fazem para prolongar o impasse. Com este ritmo e esta cegueira, aonde chegaremos?

É deprimente observar a actual governação portuguesa e não sabermos qual é a sua maior preocupação: o bem geral e o resgate do país ou a de não incomodar a constante plêiade de interesses instalados?

É deprimente ver uma grande percentagem de políticos - quer no Governo, quer no Parlamento - sem grande preparação cultural e sem jamais ter cultivado a concepção que Lincoln resumiu de uma forma excelsa: “que o governo do povo, pelo povo, para o povo jamais desapareça da face da terra.” Permito-me acrescentar: e que esteja sempre presente na mente de quem tem ambições políticas.

Enquanto não houver mudança de mentalidade e os sérios, verdadeiros políticos não se impuserem, a “Internacional dos capitalistas financeiros” e os poderes paralelos ao Estado podem estar tranquilos, porque a política jamais os incomodará.