DIA INTERNACIONAL DA MEMÓRIA.
PRIMO LEVI, O ESCRITOR QUE MELHOR A
TRANSMITIU
Em Novembro de 2005,
a Assembleia Geral das Nações Unidas estabeleceu que o dia 27 de Janeiro seria
o dia de comemoração do Holocausto.
Escolheu-se esta data,
precisamente porque foi em 27 de Janeiro de 1945 que o exército soviético
libertou o campo de concentração de Auschwitz, o maior campo de extermínio nazi.
A Primo Levi, sobrevivente
de Auschwitz e um dos escritores mais representativos do séc. XX, devemos uma
descrição objectiva dessa Memória, onde procurou evitar o que seria um normal
sentimento de vítimização ou moralismo, mas uma compreensão, com denodada
clareza (“strenua chiarezza”, uma sua expressão), para contar “os mecanismos da máquina do extermínio”, todos os matizes do
mundo atroz para onde foi deportado em 1944. “Peço aos meus leitores para não procurar mensagens nos meus livros.
Vivi uma experiência extraordinária e, desde então, procuro vórtices naquilo
que vejo”.
O poeta e pintor
italiano, Arturo Benvenuti, empregando alguns anos, conseguiu reunir 250
desenhos realizados pelos prisioneiros dos campos de concentração nazis. Esta
documentação é agora publicada num livro com o nome “K.Z.”, à distância de setenta anos da libertação de Auschwitz. É fácil
intuir que se trata de imagens intensamente emocionantes.
Em 1981, Primo Levi
escreveu o prefácio dessa obra ainda em preparação.
“À medida que o decorrer dos anos nos afasta e embora as décadas que se
seguiram não nos tenham poupado violências e horrores, a história dos campos de
extermínio hitlerianos delineia-se cada vez mais como um unicum, um episódio exemplar do malefício. O homem, tu, homem,
foste capaz de fazer isto. A civilização de que te vanglorias é um verniz, um
vestuário. Aparece um falso profeta, arranca-to e tu, nu, és um monstro, o mais
cruel dos animais. (…) As imagens aqui reproduzidas não são um equivalente ou
um decalque, pois elas substituem as palavras com vantagem: dizem o que as
palavras não sabem dizer”. (…)
A cidade de Turim presta
uma grande homenagem a Primo Levi, “um dos seus filhos melhores”, organizando
uma mostra que “percorre todas as estradas do escritor, todos os mundos de Primo
Levi”.
Esta mostra, por
ocasião dos setenta anos da libertação de Auschwitz, é intitulada “Una Strenua Chiarezza”. Está instalada no Palácio Madama (centro da
cidade).
Foi promovida pelo “Centro
Internacional de Estudos Primo Levi” e permanecerá aberta de 22 de Janeiro a 06
de Abril.
Uma esplêndida
ocasião para visitar Turim, além dos normais atractivos, obviamente.
Uma jornalista do
Jornal La Stampa, Mónica Perosino, no
dia 23/01/2015 publicou uma carta inédita de Primo Levi.
Quando Mónica
Perosino tinha 11 anos, em 1983, leu o famoso livro de Primo Levi: “Se Isto é um
Homem”. Suscitou-lhe muitas perguntas a que não sabia dar respostas. Resolveu
escrever ao escritor. Procurou o endereço e a carta partiu: por que razão
ninguém fez nada para acabar com o extermínio? Os alemães eram maus? A criança
de então queria saber se o mal existia.
A resposta chegou; muito interessante. Traduzo o que lhe escreveu Primo Levi
25/04/1983
Querida
Mónica.
A
pergunta que me colocas, sobre a crueldade dos alemães, deu água pela barba a
muitos históricos. Na minha opinião, seria absurdo acusar todos os alemães daquela
época; e é ainda mais absurdo envolver os alemães de hoje nessa acusação. É
certo, porém, que uma grande maioria do povo alemão aceitou Hitler, votou nele,
aprovou-o e aplaudiu-o enquanto obteve sucessos políticos e militares. Contudo,
muitos alemães, directa ou indirectamente, também tinham devido saber o que
acontecia, não só nos campos de extermínio, mas também em todos os territórios
ocupados, especialmente na Europa Oriental.
Portanto,
em vez de crueldade, acusaria os alemães daquele tempo de egoísmo, de
indiferença e, sobretudo, de ignorância voluntária, porque quem queria
realmente conhecer a verdade podia conhecê-la, e dá-la a conhecer; aliás, sem correr
riscos excessivos.
A
coisa pior, vista num campo de extermínio, creio que seja mesmo a selecção que
descrevi no livro que conheces.
Agradeço-te
por me teres escrito e pelo convite de ir à tua escola, mas neste período estou
muito ocupado e ser-me-ia impossível aceitar.
Saúdo-te
com afecto.
Primo Levi
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