segunda-feira, junho 15, 2015

EMERGÊNCIA MIGRANTES
E O COMPROVADO EGOÍSMO EUROPEU

Mas antes de falar da quotidiana tragédia que envolve milhares de adultos e crianças, em fuga dos próprios países em guerra ou em busca de melhores condições de vida, desejaria reportar-me a um outro género de tragédia social não menos comovente.

No mundo, existem cerca de 186 milhões de crianças e adolescentes com menos de 16 anos que são constrangidos a trabalhar. Mas pior ainda, oitenta e cinco milhões desses menores vivem imersos em trabalhos de alto risco.
Uma percentagem mais elevada trabalha na agricultura; seguem-se as actividades domésticas, o trabalho nas fábricas e minas. Frequentemente, em circunstâncias de grande perigo, além de cruelmente explorados.

Apontam a África subsariana como zona onde o trabalho de menores é mais intenso, todavia, nos ditos países avançados - na nossa Europa, por exemplo - esse triste fenómeno é bem real. Existe na Itália e sei que o nosso país não está imune dessa penosa verdade.

O dossiê da “Organização Internacional do Trabalho”, apresentado no Dia Mundial contra o Trabalho Infantil de 12 de Junho, é muito completo e ilustrativo sobre o que sucede: quer a realidade dos factos, quer no que concerne as consequências negativas para o futuro destes menores. Mas em primeiro lugar, é ao sofrimento destas pobres crianças que se deve pôr cobro, e sem quaisquer reservas, embora o período de crise acresça conjunturas deste género.
Estes dossiês servem e servirão sempre para recordar aos diversos Estados a falta de atenção a estas situações inadmissíveis, assim como as medidas necessárias para as combater e remediar. Aliás, existem leis que clarificam as regras de admissão de um menor ao trabalho. O problema é que são deliberadamente ignoradas.

Migrantes: centenas, por vezes milhares, os que quotidianamente são resgatados das águas do Mediterrâneo e postos a salvo nos portos do Sul de Itália, as portas de entrada mais próximas do inferno donde provêm.
Nestas duas últimas semanas, só em quatro dias desembarcaram cerca de sete mil migrantes nas costas italianas do sul.  

A maior parte destes migrantes, provenientes sobretudo da Eritreia, Somália, Etiópia, Costa do Marfim e Sudão, desejam prosseguir viajem até aos países onde têm parentes ou uma comunidade de compatriotas, isto é, Alemanha, Áustria, Suécia e França. Porém, este último país determinou um bloqueio total nas suas fronteiras com a Itália.
Tem-me deixado atónita a falta de humanidade e um certo racismo, embora camuflado, no que se tem verificado em Ventimiglia, cidade de confim entre Itália e França.
O país da “Liberté, Égalité, Fraternité” deu um pontapé ao famosíssimo lema e decidiu não permitir a entrada, nomeadamente a quem tem a pele mais escura. As notícias aludem a 200 pessoas acampadas nas proximidades da fronteira e que não desistem de chegar ao destino almejado. Alguns têm dormido nos escolhos, outros arranjam-se como podem, embora auxiliados pela Cruz Vermelha e organizações similares.

O Sr. Ministro da Administração Interna francesa, Bernard Cazeneuve, disse muito claramente que é a Itália que deve assumir o encargo dos migrantes, qual primeiro país de acolhimento. Que se arranje e que, acima de tudo, os identifique, distinguindo se são migrantes económicos ou refugiados.

Mais diz o Sr. Cazeneuve: “O fenómeno migratório perante o qual nos encontramos é de uma amplidão sem precedentes em relação aos anos passados. Os migrantes da África ocidental, migrantes económicos irregulares, devem ser repelidos nas fronteiras. Depois há os que são considerados refugiados e dos quais devemos examinar o seu pedido de asilo. Serve uma política europeia de acolhimento”.

Política europeia?! Pressupõe-se política de solidariedade, seja para com os migrantes que arrostam com perigos sem fim, seja para com a Itália e Grécia onde estes infelizes aportam. Distribuí-los nesta Europa sem fronteiras é o mais lógico e conforme as possibilidades de cada país. No entanto, o que se tem observado? Solidariedade ou o comprovado egoísmo que tem caracterizado a UE dos últimos tempos?
A “emergência migrantes” está à vista de todos, mas na União decide-se de não decidir. Os Estados-membros dizem sim, mas que a repartição se efectue unicamente sobre base voluntária. 
Pobre coesão, sempre ignorada. Execrável miopia da Europa, sempre exibida.