segunda-feira, fevereiro 22, 2016

UMBERTO ECO, O ASSOMBROSO INTELECTUAL


Morreu às 23,30 do passado dia 19 deste mês de Fevereiro. A notícia ecoou por todo o mundo, tão elevada é a sua fama de académico de intensa cultura – poder-se-á dizer que é uma cultura sem limites.

Os títulos dos jornais italianos demonstravam o afecto e admiração por este “filósofo, pai da Semiótica, escritor, docente universitário, articulista feliz, especialista em livros antigos, crítico literário”.
Paralelamente, não omitem de sublinhar a sua bondade de carácter.
“Gentil, generoso, afável. Eco recusou a cátedra que a América lhe oferecia, brincando: «Não posso viver num país onde não se fuma nem se bebe um café» - “Adeus a Umberto Eco, com ele a cultura tornou-se Best-seller” - Gianni Riotta; jornal La Stampa.
 
Sempre segui com interesse e grande simpatia as suas entrevistas ou participações televisivas. O que facilmente se notava eram atitudes e comportamentos simples. Jamais adoptava tons de arrogância ou do intelectual pomposo de vastos saberes. Pelo contrário, esses vastos saberes impeliam-no para a simplicidade e uma espontaneidade que se aliava à naturalidade da sua ironia e bom humor.

O semanário L’Espresso intitulou a notícia da sua morte: “Caro Umberto, deixaste-nos órfãos”. Efectivamente!
De há vários anos, Umberto Eco exprimia as suas opiniões neste semanário, na célebre rubrica “Bustina di Minerva”.
O nosso crítico literário, António Guerreiro, traduziu Bustina di Minerva em (“A coruja de Minerva", como sabemos, é a ave da filosofia, aquela que Hegel dizia que só levantava voo ao crepúsculo).

Alguns anos atrás, falei desta célebre coluna do Espresso, “Bustina di Minerva”, escrevendo sobre a explicação que Umberto Eco dera sobre a escolha deste título. Repito-a: “O título da rubrica deriva do nome da carteirinha (bustina) de fósforos, Minerva, que traz sempre no bolso para acender o cachimbo. Quando lhe surgem ideias para os seus artigos, anota-as no que tem à mão: normalmente, a carteira de fósforos Minerva. Daqui nasceu “A Bustina di Minerva”. 
É possível que Umberto Eco tivesse aludido à ave da filosofia, porém, quando se decidia a escrever, não levantava voo ao crepúsculo: confessou que escrevia nos fins-de-semana.  

Os livros, a leitura, o amor pela leitura, a defesa dos livros em papel, enfim, a atmosfera que circunda publicações literárias ou menos literárias, pode dizer-se que foram uma das grandes paixões de Umberto Eco.
Mais uma razão por que cultivo um grande interesse e simpatia por este assombroso intelectual.
Possuo seis ou sete obras deste escritor. Sempre me despertaram grande curiosidade as suas frases célebres. E são tantas! Transcrevo algumas, precisamente sobre livros:

O bem de um livro está em ser lido.
Uma biblioteca não se limita a recolher os teus livros; lê-os também por tua conta.
A biblioteca é o testemunho da verdade e do erro
Um livro bem escolhido salva-te de qualquer coisa, até de ti mesmo.
Quando escreves um livro, não tens o controlo sobre o que os outros compreenderão.
Pode-se ser culto, quer tendo lido 10 livros, quer 10 vezes o mesmo livro. Deveriam preocupar-se aqueles que de livros nunca leram nenhum.

Quem não lê aos 70 anos terá vivido uma só vida. Quem lê terá vivido 5.000 anos: existia quando Caim matou Abel, quando Renzo casou com Lúcia, quando Leopardi admirava o infinito. Porque a leitura é uma imortalidade para trás.

Termino com um conselho de Umberto Eco, fora do tema livros:
"Deixa falar o teu coração, interroga as caras, não escutar as línguas..."