segunda-feira, maio 30, 2016

MAS O QUE É, AFINAL, UMA GERINGONÇA?

Linguagem corrupta, má de entender; coisa mal engendrada; engenhoca”. - Dicionário de José Pedro Machado.
Linguagem vulgar, informal, calão, gíria; o que é malfeito, com estrutura frágil e funcionamento precário…” - Dicionário Houaiss.
Carripana, carro velho e frágil; maquinismo complicado; mulher com andar desengonçado; desajeitada. – Dicionário de Expressões Populares Portuguesas, de Guilherme Augusto Simões.

Outros dicionários não oferecem uma maior riqueza de acepções deste vocábulo, hoje de grande actualidade. Precisamente pelo uso e abuso, quando atribuída a um importante órgão de Estado, a palavra “geringonça” torna-se-me extremamente antipática e só releva falta de elegância e bom gosto na linguagem que temos o dever de equilibrar, sobretudo em relação aos organismos mais representativos da nossa democracia.

Um Governo tem maioria parlamentar e é eleito democraticamente. Podemos concordar ou discordar da sua formação ideológica, quer de centro, de direita ou de esquerda; podemos concordar ou discordar da sua actuação como administrador da coisa pública. Porém, é sempre o Órgão executivo, um dos principais pilares de um Estado de direito.

Critiquemo-lo sem ambages e quando o mereça, mas a língua portuguesa proporciona-nos um vocabulário riquíssimo que poderemos seleccionar sem cair nos vulgarismos. Ademais, sempre acreditei que tudo se pode dizer, mesmo expressando juízos desassombradamente contundentes. Todavia, uma expressividade curada fustiga com mais eficácia do que uma verbosidade pejada de apreciações grosseiras.
Deploro que, nos tempos actuais, esta verbosidade grosseira seja normal na classe política portuguesa; aliás, mostrando-se ufana em exibir, com ostentação, esta penosa ausência de elegância expressiva. É triste!

Dizem que foi o Sr. Paulo Portas que classificou o actual Governo como geringonça, ou seja: uma engenhoca, uma caranguejola.
O termo pegou, os jornais usam-no frequentemente, mesmo a despropósito. Vejo esse exemplo no meu jornal preferido, o jornal “Público”, e lamento-o.

Mas voltemos ao político geringonça, isto é, ao Senhor Paulo Portas, e olhemos os significados de geringonça referentes à linguagem: linguagem corrupta, má de entender; linguagem vulgar, informal, calão, gíria.
Surge-me a impressão que Paulo Portas, prestigiado jornalista, confunde o sentido das palavras, e isto é inexplicável.

Como Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros, lê-se o ponto 2, na sua Carta de 02/07/2013, o seguinte: Com a apresentação do pedido de demissão, que é irrevogável, obedeço à minha consciência e mais não posso fazer”.

Como foi possível que, tendo obedecido à sua consciência, esta não tivesse sabido interpretar, na sua completude, o vocábulo “irrevogável”, visto o que se verificou posteriormente? Esclarecendo melhor, verificou-se uma marcha atrás, atropelando mortalmente aquele “irrevogável” sem quaisquer titubeações.

Conclui-se, portanto, que para Paulo Portas o irrevogável e geringonça entram no que se classifica como “linguagem corrupta, má de entender”. Será? Poder-se-ia dizer, então, que Paulo Portas – futuro comentador político televisivo – foi um político geringonça? “Uma coisa mal engendrada”?
Não imitemos os impulsos agressivos da sua dialéctica e concedamos-lhe o benefício da dúvida.